10/03/2008

Preservar e Crescer

Não pretendo aqui defender a especulação imobiliária, nem a destruição do patrimônio construído ou sua substituição indiscriminada por novas edificações, mas contribuir com uma análise crítica do modo de produção capitalista do espaço urbano e suas implicações na preservação da ambiência construída. E também destacar como os vazios urbanos são preenchidos e a quais pressões estão sujeitos nas adequações urbanísticas de um determinado sistema econômico.
O projeto de um mercado na rua Treze de Maio, provocou manifestações contra, já que seria um absurdo em função da sua vizinhança – a Catedral e a casa da Princesa Isabel - com prejuízos ao turismo. A discussão não leva em conta a destopia urbana – entendida como o conjunto de alterações morfológicas na forma de usar e ocupar a cidade - provocada pelas mudanças na sociedade e inerente ao desenvolvimento das aglomerações contemporâneas.

A propriedade fundiária, é bem de produção. Como máquinas produzindo bens de consumo, o terreno urbano produz uma mercadoria especial (com valor de uso, valor de mercado e agregando valor simbólico, – por isso especial): o espaço urbano. Este espaço, mutante segundo o modo de produção de cada época, é ocupado, estocado e objeto de especulação no sistema capitalista. E participa da sua lógica de produção tal como as outras mercadorias.

Sem estas considerações, a questão é tratada na base de um maniqueísmo inócuo, sem contemplar o conjunto de variáveis que provocam as mudanças na morfologia e nos costumes urbanos. Nem as interações da práxis urbana.

Do ponto de vista do direito constitucional de propriedade, um terreno situado dentro do perímetro urbano tem seu valor mercadológico fixado em função de sua capacidade de (re)produção na economia. A decisão de alterar esta situação, e desvalorizar o imóvel por uma restrição suplementar – a legislação permite determinado uso, mas um impedimento extralegal, como tombamento, o impede – deve resultar de uma cuidadosa análise. Quando o interesse público (não confundir com o interesse do público) determinar, é garantida uma indenização plena, levando-se em conta o potencial econômico do imóvel, o que é regulamentado pelas Leis que tratam da propriedade fundiária, inclusive no que diz respeito à sub-utilização.

Petrópolis possui atividades sociais e econômicas (além do turismo) próprias que podem evoluir ou deteriorar-se. A manutenção e otimização de sua ambiência urbanística dependem de sua capacidade de produzir riquezas, empregos e bem-estar social.

O argumento que a casa nos terrenos em tela é tombada, não procede. O que é tombado é o conjunto arquitetônico da rua Ipiranga. Considerar aquela construção em “estilo alegórico”(foto acima) como fazendo parte deste conjunto, quando configura uma excrescência, é insustentável e presta um desserviço à preservação, por tentar impedir a renovação em áreas centrais e atentar contra sua sobrevivência. Seria desejável que fosse substituído por uma melhor e mais discreta arquitetura.

As reações contra a construção de um mercado em uma área na rua Treze de Maio (são três terrenos: um no n° 35 da rua Ipiranga; um segundo, intermediário, sem testada para logradouro e um outro onde se projeta a ocupação, com 26,00m de testada no n° 56 da rua Treze de Maio ) e a crucifixão do superintendente do IPHAN por não se ter oposto ao que afinal não podia opor-se, são infundadas: a legislação edilícia o permite, tanto que já existe um estabelecimento do gênero na rua, respeitando-se os afastamentos, gabarito etc. Para tanto, o IPHAN estabeleceu parâmetros de modo a que as novas edificações harmonizem-se discretamente com a vizinhança, causando a menor intervenção possível.

Sendo Petrópolis uma cidade onde os estilos arquitetônicos, do neoclássico ao Art-Deco, convivem harmoniosamente, os bons exemplos da arquitetura contemporânea devem ser incentivados.

Que o que for erigido no local tenha qualidade arquitetônica digna do entorno a que pertence, evitando monstrengos no modelo “normando/mcdonaldiano!

5 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns.
Bom e claro, me fez mudar de opinião sobre o assunto. Onde posso saber mais?

Alfredo

Anônimo disse...

Você tem razão. Se a foto é do que querem preservar, não vejo nenhum sentido. Além de não ser bonita a casa não é típica da época que se quer preservar. Mantenha a gente informada sobre esse negócio. Por falar em negócio será que isso tudo não é forçassão de barra da concorrência?

Anônimo disse...

1 Não sou arquiteto.
2 Não sou político
3 Moro no Rio de Janeiro e vou a Petrópolis de vez em quando
4 O local em questão não tem nada que me faça subir a serra
5 Minha única preocupação é se o supermercado não vai piorar o trânsito que já é um inferno em Petrópolis
6 Será que não há em Petrópolis arquitetos que possam fazer um projeto que não agrida a vista do entorno?

Saudações a quem escreve

A Simeone

SBWD disse...

O artigo que escreví para este blog, antes de tomar partido pela construção ou não do tal mercado, teve a pretensão de analisar a produção do espaço e o preenchimento de vazios urbanos numa economia dita de mercado.
Propositadamente não entrei em considerações estéticas, nem preservacionistas.
Assinalei que um imóvel como aquele, teria necessariamente que ser ocupado por uma atividade rendosa.
É claro que o projeto pode ter uma volumetria discreta - existem arquitetos em Petrópolis capazes de criar tal volume.
Quanto às interferências no tráfego, estas dependerão do controle de fatores como horários, volumes de cargas, meios de transporte empregados etc. Que poderão aumentar o "inferno em Petrópolis" ou estarem dentro dos limites toleráveis de infernização serrana.

Anônimo disse...

Você falou uma coisa que faz sentido. Vou muito a Petrópolis nos fds e sempre pego muito transito. E sempre tem muitos caminhões fazendo entrega muitas vezes parados em fila dupla. É permitido ou é mais umas daquelas leis municipais que não pegou porque ninguém controla?
Outra coisa num dos dias em que subi estava com um amigo que me mostrou um caminho diferente para chegar no centro. Foi muito rápido. Da vez seguinte ao tentar fazer o mesmo me perdi completamente porque não tem nenhuma placa indicativa!
Abços
A Silva

 
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